Páginas

domingo, 19 de abril de 2009

: Direitos e o que é cidadania.

Um dos méritos da Revolução Francesa em 1789 foi o de acabar com o Antigo Regime. De acordo com Martinez , o poder revolucionário ruiu as bases do absolutismo, alicerçadas nos privilégios da elite, os nobres, o clero e a monarquia. Entre outras, a burguesia, classe em ascensão, preocupou-se em estabelecer alguns pontos. Entre os pontos mais importantes, pairava a preocupação do que deveria ser demolido ou preservado. Quanto às pretensões das massas populares, era preciso determinar através de promessas as aspirações populares de igualdade, liberdade e fraternidade.
O que se conhece como cidadania teve suas sementes lançadas no século XVIII, como o Iluminismo. Ou seja, o uso da razão, o desenvolvimento da ciência, um novo conceito de classes sociais, fizeram surgir novas concepções ideológicas sobre o homem.
Foi na Inglaterra e na França, países mais desenvolvidos até então, que a burguesia se sobressaiu como uma força ascendente. Enquanto isso, a nobreza, a monarquia e o clero dominavam a economia e a política. A burguesia, não possuía títulos de nobreza,, não descendia de famílias de nobres ou do clero. Mas, controlava o comércio, a exploração colonial, a indústria que surgia e sustentava a economia monárquica e mais, impulsionava o desenvolvimento científico, tecnológico e apoiava as artes. Com tanto poder nas mãos, a burguesia procurou se destacar da massa, do povo, e buscou uma igualdade até mesmo entre aqueles que estavam no poder.
Essas transformações são como um processo revolucionário, o qual se deu por fases intercaladas temporal e espacialmente. Todavia, na França, as transformações sociais e políticas ocorreram de forma mais extrema, culminando na derrocada brusca do Antigo Regime. Sob um novo olhar, o científico, uma concepção de um universo em constante movimento, o homem buscou a liberdade e seu progresso. A partir da queda do Antigo Regime, a burguesia deixa de ser classe popular, cedendo seu lugar ao proletariado.
Entre os ideais filosóficos e a realidade existem algumas diferenças. Homem real e cidadão são distintos quando se trata de uma nova forma usada para justificar a dominação conhecida, em virtude de uma nova ordem social e econômica nascida com a com o expansionismo industrial. Lembrando da sociedade no sistema feudal, a transição para o capitalismo, destacando-se a Inglesa, pela Revolução Industrial, formou-se classes de trabalhadores livres, artesãos e camponeses. Um novo tipo de sistema, onde cada indivíduo executava uma tarefa nas várias fases de produção, acabou por criar um novo tipo de homem, individual, mais unitário. Era, assim, a tecnologia separando e redefinindo o papel do homem na sociedade. Uma sociedade na qual o homem se distanciava do que era conhecido como comunitário. E cada vez mais os direitos e condições materiais eram retirados do trabalhador. Entretanto, os industriais, os comerciantes e os banqueiros – a burguesia ascendente – acumulavam mais lucros e riquezas. Conceituando cidadania, associando-se à burguesia e não à massa, ao povo, teremos, até menos pela origem etimológica da palavra, impõe-se assim uma separação entre o homem da cidade e do campo.
Com a definição burguesa de cidadão, uma ideologia de poder se formara, para justificar a dominação de uma classe sobre a outra e, repassar o ideal ilusório de igualdade. Entre as definições de cidadão, era então, ser sujeito de direitos e deveres. Porém, com tantas mudanças pelas quais passaram a sociedade e a economia, os conceitos de direitos e deveres também sofreram alterações. E tais alterações influenciariam apenas os direitos e deveres do homem das classes mais baixas. A participação da massa popular na sociedade estava condicionada à proporção de suas posses materiais. A aparente igualdade entre todos proporcionada pela lei não faria desaparecer as discrepâncias no que dizia respeito à liberdade de expressão, votar e ser votado e aos direitos à educação ou à venda e produção de bens.
Considerando homem real e homem cidadão, há alguma distinção entre o que se conhecem como direitos humanos e direitos de cidadania? Direitos humanos são então tudo que se relaciona com a preservação à vida. Ou seja, direito à alimentação, abrigo, segurança, moradia, saúde etc. Direitos de cidadania relacionam-se com a participação política e social. Liberdade de expressão, votar e ser votado etc. Todos os homens nascem com direitos universais, que posteriormente, transformam-se em particulares. Durante sua vida, os direitos do homem tornam-se interdependentes. Daí surgem as bases de lutas e das reivindicações. Entre elas, o homem reivindica o direito de voto, a redução da jornada de trabalho, moradia, alimentação, constituição de associações, liberdade de expressão etc.
O termo liberdade possui sentidos diferentes em relação ao homem e ao cidadão. Grosso modo, trata da privação do direito de ir e vir, não ser molestado física e moralmente, escravizado ou da preservação de sua vida. No Brasil, os direitos de cidadania, seus avanços e retrocessos vêm carregados com os costumes da sociedade colonial. E por não terem sido abolidos ou renovados, constituem-se em entraves para o desenvolvimento de relações sociais mais justas. Esses obstáculos legados da época colonial criaram preconceitos não somente quanto aos aspectos materiais, mas também sob a origem social, etnia, sexo, faixa etária e cultural. Pode-se constatar claramente a discriminação nas relações de produção e de trabalho entre o campo e a cidade. Os direitos do homem do campo não são iguais aos do homem da cidade, mas, sim, até menores.
Em quaisquer circunstâncias, por mais sérias ou não, o homem é norteado pelo pensar e agir, de acordo com os conhecimentos de que dispõe. Todavia, isso não importa. O que tem consistência é o fato de que o homem quase sempre reflete sobre seus atos praticados. É certo de que o cidadão formado procura se situar dentro do contexto no qual está inserido. A educação tem como objetivo atuar como um elo entre alguns valores éticos e morais com a prática.
É prática usual em quase todo o mundo de que a maioria das leis divide-se em direitos e deveres. A constituição brasileira, promulgada no dia 05 de outubro de 1988, por exemplo, traz uma gama variada de princípios, mas ao mesmo tempo, nega alguns direitos. Outro direito que desde os primórdios da civilização tem sido desrespeitado é o voto. Critérios restringiam o acesso do indivíduo político. Como por exemplo, tais critérios restritivos se davam por conta da posição social, econômica, sexo, idade etc. Cidadania é por excelência efetivada pela conquista concreta de direitos e existência e da participação nos mais variados segmentos sociais e políticos. A participação como ação política se destaca na forma coletiva. E como instrumento fundamental para a formação da consciência política, a eis que a educação aparece em destaque. E pela restrição da educação, que o Estado autoritário procura diminuir a capacidade de raciocínio crítico, ofertando um ensino voltado mais para a formação do para o trabalho do que para a formação humana e cidadã. A ONU, (Organização das Nações Unidas), em 1948, proclamou como universais os preceitos iluministas e da Revolução Francesa dos direitos humanos, ratificada e promulgada na Conferência Mundial de Direitos Humanos. A declaração Universal dos Direitos Humanos teve como meta convencer todos os países de que deveriam aprovar leis que coibissem práticas que visassem a preservação da vida como forma do desenvolvimento democrático. Todavia, o desrespeito aos direitos humanos parece-nos que é uma regra entre aqueles que decidem o destino do mundo.
Dentro da própria conferência, a China, que acabara de invadir o Tibet, impediu a participação do Dalai Lama, líder espiritual budista ao evento. Outro caso que coloca em xeque a lisura e as boas intenções dos governantes mundiais presentes na Conferência Mundial de Direitos Humanos fora a aprovação da criação de um órgão na ONU, liderado pelos Estados Unidos, cujas funções seriam de intervir, com força armada, se necessário, em outros países. É muito fácil aprovar leis que propõem a preservação da vida humana. Mas, em guerras como o conflito da Bósnia-Herzegovina, vários direitos humanos aconteciam debaixo dos olhos da Onu. Crimes contra civis, entre outros como, tortura, estupro, discriminação étnica etc. Ao que tudo indica, direitos humanos, prosperidade econômica e democracia são praticáveis apenas quando o mundo não está em guerra. Um outro ponto a ser discutido sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi a sua aprovação, ou melhor, a sua imposição. Algumas décadas depois, alguns países asiáticos questionaram unto à ONU alguns preceitos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esses países questionavam a questão cultural e religiosa voltada apenas para o mundo cristão ocidental.
Os países asiáticos que interpelaram contra a ocidentalização da Declaração dos Direitos Humanos alegaram que tais leis interferiam até na soberania nacional de todos eles. Como resposta, a ONU tentou aprovar medidas punitivas aos países asiáticos. Entretanto, as decisões da ONU contra os países asiáticos foram inócuas. No Brasil, o desrespeito à cidadania é uma prática que vem desde os tempos da invasão portuguesa no século XVI. Isto é, ocorrem com as populações de indígenas, de negros, mulheres e com os pobres. Mesmo com uma gama de direitos estabelecida pela Constituição Federal, o cumprimento de tais direitos fica aquém do que se pretende. Os colonizadores portugueses de início tentaram impor sua cultura de “homem branco civilizado” levados pela concepção do etnocentrismo, ou seja, o outro, o índio, ainda estava no modo de vida primitivo. Então, os portugueses, crendo ser a cultura européia mais avançada e superior, solaparam a cultura indígena, através da catequização e introdução do trabalho forçado.
Perseguições, genocídio generalizado foi uma prática comum e usual, tanto pelos colonizadores quanto pela Igreja. Atualmente. O índio encontra-se reduzido a números irrisórios. Algumas tribos encontram-se em estado de miséria. Muitas aldeias se localizam próximas de cidades. Sem nenhuma reserva descente, com matas, cursos d água e outros recursos que possam colocar o índio mais próximo de seu habitat natural. Outras tribos, habitando em reservas que proporcionam uma vida mais próxima da que tinham em seu habitat natural, passam por problemas da mesma natureza como a miséria e ainda, por invasão de suas terras por grandes fazendeiros, grileiros, indústrias de mineração e extrativismo vegetal, garimpeiros e toda a sorte de religiões cristãs. Não muito diferente do índio, o negro também tem no Brasil um tratamento vergonhoso. Desde a implantação do sistema escravista no Brasil, um modelo que não respeitava de antemão, a liberdade natural, a exploração do homem pelo homem, ainda se fez sob a privação de direitos mínimos, muita tortura, privação dos direitos à religião e à cultura negra. O que o negro africano fez então, desde que aqui, no Brasil chegou, foi fugir organizar-se em quilombos. Os quilombos foram importantíssimos na luta dos escravos pelo direito à vida. Na organização do quilombo estava, entre outras, a luta pela liberdade, contra os maus-tratos e previa-se uma produção de alimentos em comum, pela agricultura, da caça e da pesca. (Martinez, 1996) Era uma forma de resistência contra a dominação do branco, que queria viver às custa do negro, e este último, querendo ser livre, tomarem suas próprias decisões, segundo Martinez , era uma guerra entre dois povos, duas civilizações. Nem mesmo com a abolição da escravidão, o negro pôde ter seus direitos assegurados nas leis respeitados.
Há no Brasil uma democracia racial velada, ou seja, a discriminação impede que o negro tenha as mesmas oportunidades na sociedade porque seus direitos não são respeitados, e as leis que existem não são cumpridas. Isso acarreta uma série de anomalias sociais. Entre as anomalias está o desemprego, trabalhos mais degradantes e salários inferiores. No caso da mulher, alguns direitos foram reconhecidos há poucas décadas atrás. Por volta das décadas de 1960 e 1970, quando, a partir de um crescimento econômico da indústria, a mulher foi ocupando alguns postos de trabalho devido à demanda por mão-de-obra. A participação da mulher no mercado de trabalho deu-se também por motivos de recessão econômica, forçando-a na complementação do orçamento familiar. Mesmo tendo conquistado vários direitos e ter sua igualdade ao homem reconhecida, ainda assim, a mulher sofre de discriminação social. A mulher, mesmo equiparando tecnicamente ao homem, ainda recebe salários inferiores e ocupa menos cargos de relevância no mercado de trabalho. Um direito adquirido por lei, pela mulher e que sempre é desrespeitado é o direito à maternidade. O empregador sempre procura meios para demitir a mulher grávida, até mesmo porque a maioria das empresas não possui ou não se interessam em ofertar uma creche para suas funcionárias. E para piorar a falta de respeito à cidadania da mulher, muitas delas são esterilizadas sem o próprio consentimento. Crime de violência contra a mulher ainda são freqüentes, e para inibir essa prática, de uma sociedade patriarcal e machista, foi preciso criar delegacias especializadas em crimes contra a mulher.
A pobreza é de certo um problema social, para quem se encontra nela. O cidadão pobre é discriminado por vários fatores. Etnia, cor da pele, sexo, faixa etária, credo etc. Estando a maior parte das terras do Brasil nas mãos de uma minoria, os pequenos proprietários, quando acuados por dificuldades financeiras ou por fenômenos climáticos que assolam o país, vêem-se obrigados a vender sua força de trabalho. Esses trabalhadores tornam-se bóias-frias, sem nenhum mecanismo trabalhista que os ampare. A migração de trabalhadores rurais, a procura de empregos nos grandes centros urbanos torna grande a oferta de mão-de-obra barata, facilitando a ocorrência de trabalho escravo, em condições subumanas.
O conceito de cidadania é o que se pode dizer de tudo que se conhece por direitos humanos. A elaboração dos direitos humanos do homem já vem de longas eras, desde o momento em que a humanidade iniciou a construção da vida em sociedade. Ainda há muito que ser feito. Entre elaborar leis e fazê-las serem cumpridas. A única lei que deve ser indeferida é a lei do mais forte.


MARTINEZ, Paulo. 1933 – Direito de cidadania: um lugar ao sol.
São Paulo. Martinez. – São Paulo: Scipione. 1996. (Ponto de apoio)

LUTAS URBANAS

A questão da moradia é um dos fenômenos responsáveis pelos movimentos que reivindicam melhorias em comunidades urbanas. Conforme diz Maria das Mercês Gomes Samarriba, as formas de associação, ligadas principalmente às lutas populares nos grandes centros urbanos têm chamado a atenção dos setores públicos e da imprensa em geral. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984.p.15) O crescimento urbano nada mais é do que a expansão do sistema capitalista, ou seja, a concentração dos meios de produção e da força de trabalho. E, o Estado, quando não se propõe a fornecer os meios necessários para a ocupação urbana, assim como os meios de consumo, torna piores as condições de vida da classe operária.
Cada serviço nos meios urbanos tem um preço. Esse preço está no valor do aluguel ou do imóvel propriamente dito, que é fixado de acordo com a existência de serviços, como escolas, transportes, assistência médica, entre outros, oferecidos próximos da localização do imóvel. A degradação das condições de moradia da massa popular faz com que surjam conflitos sociais e, desses, a organização dos movimentos sociais. Os movimentos sociais possuem características distintas, mas, grosso modo, estão baseados na luta pelas melhorias da reprodução social do trabalhador. Seja pela questão da saúde, transporte, educação, moradia ou outros, como a exploração do mercado de trabalho, visando à mudança na relação social de poder, Mas, em sua essência, são movimentos que agem direta e indiretamente pelo acesso do coletivo aos equipamentos urbanos, Têm uma composição bem eclética da população e, seu alvo principal é o Estado.
Quando se trata do coletivo e da reprodução social, básica e essencialmente não se quer dizer apenas das condições de melhorias proporcionadas pelos salários. É preciso lembrar que velhos e crianças, que não são consumidores, possuem necessidades de bens de consumo duradouro e necessidades especiais, como a assistência à saúde e a formação profissional. Estes bens de consumo duradouros são de responsabilidade do Estado. Devido às crescentes exigências de qualificação dentro da divisão sócio-técnico do trabalho a classe trabalhadora vê-se forçada às reivindicações de melhorias de sua reprodução social. Segundo Samarriba, os bens e os serviços de consumo assumem importância de sustentação da economia. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984, p.19)
Se a força de trabalho possui boas condições de reprodução social, as suas necessidades de consumo de bens e serviços urbanos dão sustentação ao mercado e ao capital. O Estado quando proporciona o acesso das camadas populares aos bens e serviços de consumo, está atuando como mediador do mercado, tentando imobilizar um setor, a mobilização popular contra si e contra a funcionalidade do sistema de produção. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984. p.22) Quando o Estado cria instituições para prover as necessidades coletivas, essas mesmas instituições acabam por fornecer à classe trabalhadora meios de luta contra os subsídios do Estado ao capital privado. Esses meios seriam, então, a insuficiência de bens e serviços de consumo, como por exemplo, àquelas classes que não estão ligadas ao setor produtivo. Assim, conforme Samarriba, os trabalhadores tenderiam a organizar-se em reivindicar do Estado equipamentos coletivos em quantidade suficiente ao desenvolvimento social e econômico. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984. p.23)
No Brasil, diferentemente dos países aonde a industrialização se originou, a relação classes populares, Estado e os meios de produção tem se pautado por questões bem distintas. Enquanto que, nesses países onde a industrialização se originou a classe operaria foi absorvida com mais intensidade, no Brasil, a indústria já fora implantada com necessidades de uma força de trabalho com capacidade técnica específica. Isso, por sua vez, segundo Samarriba, essa exigência da recém-chegada indústria no Brasil fez com que houvesse uma massa cada vez maior de desempregados. E ainda mais, essa massa de trabalhadores foi concentrando-se nas periferias das grandes cidades brasileiras. A implantação de recursos urbanos, como escolas, novas ruas, transportes mais rápidos, redes de água e esgoto, unidades de saúde, entre outros, que atendessem o crescimento populacional urbano era urgente.
Todavia, a crescente classe trabalhadora brasileira não nascera assim como a classe trabalhadora na Europa. Esta última se formara junto com a industrialização. No Brasil, o proletariado já vinha de um processo de exclusão política nesse contexto. A representatividade do proletariado europeu nascera nos movimentos operários. A representatividade do trabalhador no Brasil nascera da intervenção das classes dominantes e do Estado. E com o objetivo de consumar a não intervenção da massa trabalhadora e sua efetiva neutralização nas decisões políticas, o populismo assume o paternalismo da classe trabalhadora, indo de encontro às necessidades de regulamentação da legislação trabalhista. Entretanto, no campo da política de expansão urbana, a omissão do Estado deixou que a iniciativa privada provesse a construção de vilas e bairros e a especulação imobiliária com a total falta de recursos necessários à reprodução social do proletariado. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984. p.27)
O populismo indiretamente deu à classe trabalhadora instrumentos que lhes permitissem formar uma consciência de que a reivindicação era o caminho a ser trilhado. Formou-se a partir daí o associativismo pela luta de melhorias das condições de vida urbana, baseado na idéia de que o Estado era, e o é, responsável em atendê-las. Ao buscar as melhorias, os movimentos populares organizados não percebiam que o faziam por desconhecer suas raízes políticas, mas simplesmente, estavam questionando a legitimidade do poder do Estado.
No regime militar, os movimentos reivindicatórios assumem uma postura diferente. Passou-se a existir uma relação mais próxima das organizações partidárias. A partir daí os movimentos organizados urbanos deixaram de lado a idéia de que as melhorias proporcionadas pelo Estado eram simples e puramente uma dádiva, mas uma obrigação.
A formação de várias cidades, por planejamento, a ocupação das áreas nobres deu-se do centro para a periferia. Mesmo assim, a especulação imobiliária sempre se faz presente, na maioria das cidades brasileiras. A especulação imobiliária passa pela compra de lotes na área urbana nobre a preços ínfimos. Isso faz com que poucas pessoas se tornem proprietárias de muitos lotes.
Era comum que o Estado procurasse distribuir a ocupação das áreas centrais urbanas. A massa operária, por exemplo, é direcionada para áreas distantes do centro urbano. Em Belo Horizonte, por exemplo, para ter direito a um lote, a prefeitura colocou algumas medidas. Somente receberia o lote aquele considerado como operário padrão. Era preciso também que dois dias por ano fossem dados em trabalhos voluntários para a conservação das ruas. Outras melhorias também eram exigidas para ter o direito à compra de um imóvel. Cercar com muros, instalar água e colocar meios fios e proibia-se de abrir casas comerciais. Estava se criando em Belo Horizonte uma prática que mais tarde seria adotada em vários outros centros urbanos, ou seja, áreas tipicamente destinadas aos operários e com elas, pouca infra-estrutura. O resultado disso será, então, o aparecimento de favelas e outros bairros desprovidos dos principais equipamentos públicos, como o poder público dotava nas áreas centrais. As massas populares começam a se organizar em movimentos reivindicatórios a partir de entidades políticas e eclesiais, essas últimas, com a construção de templos nas vilas operárias. Mais tarde, com a criação das câmaras municipais de vereadores, cujas aspirações poderiam ser concretizadas na eleição de representantes oriundos dos bairros populares.
Todavia, com o Estado Novo, em 1937, toda a mobilização popular sofre uma parada brusca com a repressão. O Estado Novo propõe uma assistência maior à massa como discurso preparatório para cooptar os movimentos organizados. Somente em 1974 que os movimentos populares começam a reaparecer no cenário nacional. Retornando às décadas de 1946 a 1964, começam a germinar dentro dos diretórios políticos, os protótipos do que seriam mais tarde conhecidos como associações comunitárias, os Comitês Pró-Melhoramentos de vilas e favelas. Na década de 1950, Aparecem em Belo Horizonte a Federação dos Trabalhadores Favelados, com mais de 50 associações filiadas.
No início do regime militar, todos os movimentos são bruscamente esfriados. As lideranças dos movimentos que representavam as favelas foram presas. Projetos e leis foram criados para tentar minimizar a exclusão social dos moradores de favelas, mas nunca surtiram o efeito esperado. As favelas de Belo Horizonte, de problemas sociais, passaram a problema de segurança policial. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984.p.47). Mesmo com toda repressão, a ditadura militar deixou escapar um espaço possível de reivindicação por melhorias das condições de vida através da atuação de vereadores, mais tarde, pelos assuntos inerentes à defesa ecológica e pelo protesto de trabalhadores contra o sistema de transporte coletivo. Foi nesse deslize democrático que, também surgiu em Belo Horizonte, a imprensa de bairro. Pequenos jornais cujas matérias eram visadas pela organização e surgimento dos movimentos comunitários.
Em 1978, segundo Samarriba, o governo federal acena com possibilidades de uma flexibilização política. Nitidamente o número de associações começa a aumentar. A participação das entidades comunitárias torna-se cada vez mais um fator de interesse nacional. O Ministério do Interior e outros órgãos federais passam a incluir em seus objetivos o desenvolvimento comunitário. (SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984. p. 51) Mas, a partir de 1974, as associações começam a reivindicar mais, até mesmo a nível nacional.
Pode-se verificar que depois da abertura política no início da década de 1980, os movimentos comunitários sofreram um arrefecimento devido à repressão da ditadura militar. Todavia, nota-se que a participação da população é modesta, ficando todos os encargos das reivindicações e mobilizações sobre os membros da direção das associações comunitárias. A maioria das entidades comunitárias define sua postura como apolíticas. Entretanto, a intermediação de homens públicos faz-se necessária. Mas, porque as associações têm que se submeter aos favores de políticos quando necessitam de uma melhoria pugnada pela população do bairro que representa? Alguns programas públicos exigem que as associações sejam legalmente constituídas.
O sucesso de uma associação está intrinsecamente ligado ao sucesso de suas demandas. (SOMORRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984) A participação dos moradores em reuniões mensais varia muito. Isso pode se ocorrer quanto ao tratamento do presidente da associação para com os moradores. Outro fator importante para um bom desempenho de uma associação de moradores é possuir uma relação estável e amigável com os políticos e demais setores da administração pública. A representatividade de uma associação de moradores faz-se presente na autuação de sua diretoria, e isso conta e muito também para um bom desempenho e mobilização dos moradores.
Com relação aos conjuntos habitacionais construídos pelo Banco Nacional da Habitação (BNH), algumas associações de Belo Horizonte tiveram problemas para enfrentar a inadimplência dos mutuários junto a esse órgão. Coletar dados que podem ajudar numa possível batalha contra o BNH pode se tornar uma tarefa difícil quando alguns moradores até mesmo ex-diretores se mudam. Após a década de 1971, quando o BNH deixou de ser o agente financiador dos conjuntos habitacionais passou essa função a órgãos como a Economisa, entre outros, a inadimplência dos mutuários passou a constituir um sério problema, visto que, o BNH não executava judicialmente as ações pela falta de pagamento das prestações. O que passou a acontecer com a Economisa. Os acordos feitos entre os mutuários e a Economisa não eram de todo satisfatórios para os mutuários. Todas as propostas, além de serem inviáveis, também não agradavam aos mutuários, isso porque a maioria deles não eram os proprietários originais. Quando os imóveis vão a leilão, é muito comum que os atuais ocupantes deles sejam intimados, assim como fez a Economisa em Belo Horizonte, na década de 1971, conforme SOMORRIBA, VALADARES, AFONSO descrevem abaixo:

“Ninguém assistiu ao leilão das casas do Bairro Nações Unidas, realizado ontem, em Sabará... Nem mesmo os mutuários cujas casas estavam sendo leiloadas quiseram aparecer, apesar de terem sido todos intimados.”

Ao que nos parece, a repressão dos órgãos do sistema habitacional no Brasil vem, além das ameaças de despejo até a intimidação dos mutuários. Para restringir uma ocupação dos mutuários despejados, a Economisa montou um sistema de segurança particular.

Tudo isso pode ser conseqüência de uma inexpressiva atuação da associação de moradores do bairro. É muito comum em vários lugares, as associações sofrerem da falta de infra-estrutura, como sede própria, serviços de telefonia etc. Uma dificuldade encontrada para uma participação efetiva dos moradores junto às associações de moradores são os estatutos e suas restrições. Há em alguns estatutos, artigos que normatizam as questões das candidaturas, limitando a membros que freqüentam com assiduidade as reuniões. Um aspecto que pode ser observado em algumas associações é o da assistência social. Quando a entidade atua nessa área, a participação dos sócios torna-se mais substancial. (SOMORRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984.p.90) Outra característica comum às associações de moradores é a participação das CEBs, Comunidades Eclesiais de Bairro no auxilio em sua fundação e formação das. Algumas associações chegam a utilizar os salões paroquiais como sedes de reuniões. A mobilização da comunidade é uma das tarefas essenciais realizadas pelas CEBS. Além disso, os discursos dos religiosos trazem aos moradores as idéias de organização e participação comunitária.
A convivência das associações com os políticos pode desencadear certo ciúme entre seus membros. São tantos partidos que, os diretores, e até mesmo os moradores, ficam com ciúmes de pedir ajuda a esse ou aquele político. Pode-se também observar que a relação constante com os partidos políticos pode ser objeto desse mesmo ciúme e gerar debates e embates, conforme observaram SOMARRIBA, VALADARES, AFONSO, 1984. p. 113. Observou-se que algumas associações têm uma expressiva participação de sócios a partir da organização interna que possuem. Exemplo disso é a divulgação dos trabalhos realizados e de como funciona uma associação, através de boletins informativos internos. Uma forma que algumas associações bem organizadas encontraram para chegar a uma autonomia, ou seja, atuarem sem a intervenção direta ou indireta de políticos foi a proibição da reeleição de seus membros para o mesmo cargo. Assim, evita-se a cristalização de lideranças.
O movimento associativo em Belo Horizonte, desde que surgiu, junto com a fundação da cidade, esteve presente nas reivindicações por melhorias sociais do meio urbano. Cada movimento teve suas características próprias dentro do contexto social em que estava inserido. É notória diferença entre os movimentos dos estratos médios e altos para com os estratos mais baixos. Enquanto as primeiras estiveram mais presentes na assistência social junto às comunidades carentes, as últimas se colocaram na reivindicação de melhorias urbanas. Desde então, o Estado também assumiu uma postura diferente. O Estado passou a prover os bens de consumo coletivo, como energia elétrica, água e esgoto, escolas e transporte coletivo etc.
A atuação dos movimentos comunitários em Minas Gerais foi influenciada pela conjuntura política. E não poderia ser diferente. Quanto à participação dos moradores, essa é influenciada diretamente pelo sucesso das empreitadas pelas associações de moradores. Estudos mostram o crescimento do numero de associações de moradores, mas a participação dos moradores continua condicionada ao sucesso de suas reivindicações, e para isso, se organizam em comissões de trabalho, principalmente em assuntos de crise.


Referências bilbiográficas:

SOMARRIBA, Maria das Mercês Gomes, VALADARES, Maria Gezica, AFONSO, Maria Rezende. Lutas Urbanas em Belo Horizonte. Ed. Petrópolis. Belo Horizonte, 1984.

QUESTÃO DA MORADIA

Moradia: o capitalismo e o déficit habitacional


Segundo Ribeiro & Pechman, a questão da moradia pode ser uma criação de uma conjuntura econômica ou fatores diretamente intrínsecos com o capitalismo industrial, (Ribeiro & Pechamn, 1983. p.12). Analisando sob a perspectiva do capitalismo industrial, buscou-se explicitar como se formaram as cidades européias, cujas transformações urbanas se acentuaram na passagem da manufatura rural para a grande indústria. Na manufatura rural, as famílias produziam mercadorias e a sua própria subsistência. Quando a manufatura rural deixa de existir, em detrimento do avanço da grande indústria, o trabalhador rural passa de produtor a subordinado do capital. Nesse contexto, surgem correntes políticas, as quais diziam estar preocupadas com as dificuldades dos camponeses destituídos de seus meios de produção. Tais correntes, segundo Ribeiro & Pechamn, pretendiam transformar os trabalhadores em proprietários de moradias, o que, grosso modo, para o socialismo cientifico era utópico, ilusório e não conduziria de maneira alguma a classe operaria à luta revolucionária.

Aos trabalhadores rurais, os salários eram apenas uma forma de complementação da renda familiar. Tudo que era necessário á subsistência familiar era produzida. A idéia de que tendo posse de sua moradia, o trabalhador estaria garantindo condições mínimas de sobrevivência. Por isso, nada mais oportuno lembrar que, a burguesia sempre vive se enriquece às custas dos salários pagos ao proletariado. (Ribeiro & Pechman, 1983 p.16)


Aumento da força de trabalho. Crise no sistema imobiliário


A crise de moradias foi marcada desde a revolução industrial tecnológica pela destruição das manufaturas familiares que acarretou um fluxo migratório de camponeses para a cidade. O capital industrial criara muitos empregos, já que o trabalhador rural, destituído de suas terras, viu-se obrigado a vender sua força de trabalho. Com essa geração de empregos, também foram necessárias algumas melhorias nas infra-estruturas das cidades. Assim como a indústria, o Estado deveria fornecer uma serie de reformas que possibilitem a absorção de uma grande massa de novos habitantes nas cidades. Criação de sistemas de abastecimento de água, postos de comércio, rede de transporte publico entre outras.

A grande massa de trabalhadores que chegava às cidades procurava casas no centro, onde fica mais fácil o acesso ao emprego. Todavia, existia um déficit imobiliário. O número de imóveis não era suficiente para abrigar a todos. Com o déficit imobiliário, surgia um novo problema: não tendo moradia suficiente, os trabalhadores construíam pequenos cômodos, sem a mínima estrutura de saneamento básico. Nesse aglomerado de casas improvisadas, surge a consciência de classe, e também, as epidemias, que, por sua vez, ameaçam a saúde tanto da massa proletária quanto da elite burguesa.

É importante lembrar que a disseminação das idéias, uma consciência de classe e a falta de higiene básica fomentavam o receio da burguesia industrial, que ainda tinha temor de insurreições como a Comuna de Paris tão presente na memória de todos. A burguesia tratou de rapidamente promover reformas que visassem uma ampliação do sistema habitacional. Era preciso construir mais moradias. Segundo Ribeiro & Pechman, como acontecem em outras áreas da produção de bens e mercadorias, o capital voltou-se para o setor da construção de moradias, desde que fosse rentável. (p.24)


Sistema imobiliário: um setor deficiente.


Quando é enfatizada a necessidade de um sistema eficiente no setor de moradias, é preciso lembrar que para tal fazia-se necessário considerar certos entraves. Entre eles, a concentração da maioria dos terrenos nas mãos de uma pequena parcela da burguesia industrial. Outro fator importante era a inexistente política habitacional do Estado. Nesse caso, o Estado deveria garantir ao proletariado uma política habitacional com financiamentos em condições favoráveis e que possuísse áreas livres para evitar o crescimento urbano menos concentrado e menos desordenado. Ainda nesse caso, a concentração da maioria das terras nas mãos de poucos proprietários, fez com que a especulação imobiliária procurasse obter lucros médios sobre a mercadoria: a terra.
Segundo Ribeiro & Pechman, a posse da terra como mercadoria não possui a mesma valorização do capital como outros meio de produção, ou seja, a terra não pode ser reproduzida como mercadoria pelo capital.

Os proprietários de terras somente obtêm lucros quando podem tributar sobre o uso de valores gerados pelo uso das terras. (p.32) Daí, o capital construtor enfrenta alguns problemas, como o investimento do capital que ficará imobilizado, a cada novo empreendimento, um novo terreno, as condições de construtibilidade devem ser consideradas como fator de aplicação do capital. Todavia, para que houvesse condições do capital construtor ser aplicado, à espera de uma rentabilidade que poderia chegar até 20 anos, era preciso que esse capital estivesse envolvido num sistema, definido pela dominação/subordinação. Entram em cena diferentes tipos de agentes. O proprietário do terreno, o construtor, o financiador, o investidor e o usuário, todos integrantes no processo de produção, circulação e consumo da moradia. (Ribeiro & Pechman, 1983)


Rio de Janeiro: contexto histórico e a crise imobiliária.


A crise da moradia nas cidades européias é uma conseqüência do capitalismo, devido à rápida expropriação das famílias de camponeses e a inexistência de uma estrutura habitacional mínima que atendesse a todos os trabalhadores que migravam para as cidades á procura de trabalho.

No caso do Rio de Janeiro, a questão da moradia foi determinada pela queda do sistema cafeeiro de São Paulo, a abolição da escravatura e da aceleração do desenvolvimento da manufatura industrial nos últimos trinta anos do século XIX. Com isso, houve um aumento da oferta de mão-de-obra, negros libertos e um enorme contingente de imigrantes, que migrava para os grandes centros urbanos. Nesse ínterim, o Estado, já havia proporcionado uma melhoria no sistema sanitário da capital federal.

Com o crescimento da mão-de-obra, crescem também os problemas da cidade. A deficiência no setor imobiliário, com poucas moradias disponíveis acabaria por provocar o aparecimento dos cortiços, casas coletivas, estalagens, vilas operarias, entre outros. Morar no Rio de Janeiro, próximo ao centro da cidade era fundamental. O Rio de Janeiro já possuía um sistema de transporte implantado, uma vida urbana muito concentrada. Além disso, segundo Ribeiro & Pechman, a relação emprego/moradia era intimamente ligada e a dependência de um transporte acarretava custos. (p.46)

Enquanto os cortiços eram a solução para uns, para outros eram lucros. Um emaranhado de portinhas e janelinhas, conforme assim descreve Ribeiro e Pechman, havia uma sala onde se recebiam as visitas, passavam-se as roupas e outros assuntos mais. (p.50) Entretanto, esse tipo de moradia espalhava-se pela cidade, pelo baixo custo de aluguel e pelo retorno rentável e imediato ao proprietário do imóvel. Em contrapartida, a proliferação de epidemias pela cidade do Rio de Janeiro tornou a cidade insalubre. Quando as epidemias ultrapassaram os limites dos Bairros populares para os bairros ricos, a situação tomou a atenção do Estado e da imprensa. O Estado intervém, instaurando serviços sanitários para erradicar as epidemias, interferindo sobre a ocupação do espaço urbano. Chega então à conclusão que a erradicação das epidemias seria acabar com os cortiços, criando-se moradias populares higienizadas. (Ribeiro & Pechman, 1983)


Política de habitações higiênicas para operários, empregados subalternos e pobres.


As moradias coletivas, os cortiços e estalagens foram suportados no Rio de Janeiro para que servissem como meios de reter a mão-de-obra que a cidade necessitava. Contudo, chega um momento que esse tipo de moradia passa a causar problemas para a elite dominante, que aplicara seu capital nesse, através das epidemias, por exemplo, e, exige do Estado uma política habitacional que contemplasse à classe operaria e extinguisse o risco dessas epidemias. Se acabar com os cortiços e construir moradias descentes e higienizadas para a massa trabalhadora seriam a solução para tornar a cidade do Rio de Janeiro menos insalubre – era preciso que alguma empresa, fosse pública ou privada possuísse recursos econômicos, capital para investir e, ainda mais, um bom plano habitacional.

O Estado, desde 1853, tinha projetos que visavam a expansão das moradias coletivas no centro do Rio de janeiro. Essas áreas eram consideradas nobres, de um valor já considerado por alguns fundiários para no futuro especular no mercado. Todavia, o Estado não havia elaborado nenhum programa habitacional, mas procurou o capital privado, através de concessões, tentou estimular a construção de moradias higiênicas para os pobres. Os empresários não demonstraram interesse, pelo contrário, fizeram-se rogados. Os capitalistas não se interessaram pela proposta do governo alegando que as concessões eram irrisórias e temiam colocar em risco seus investimentos. (Ribeiro & Pechman, 1983) A construção de moradias para as classes operárias somente e sempre passou pela concessão de benefícios fiscais do Estado para as grandes empresas do setor imobiliário. Em 1895, algumas companhias fluminenses de tecelagem decidiram investir na construção de vilas operarias com moradias higiênicas. Embora fosse rentável, a produção capitalista de moradias, esse setor não prosperou ainda no século XIX, em virtude da concorrência desleal com os corticeiros, que não empregavam quase nenhum capital no aluguel dos imóveis.

República Velha: o Estado, os cortiços e os corticeiros.

No inicio da República Velha, uma lei municipal determinava que a construção de moradias nas áreas nobres do Rio de Janeiro deveria obedecer alguns critérios. Todavia, a lei restringia somente ao funcionamento das estalagens, mas reconstruí-las era permitido. (Ribeiro & Pechman, 1983) Para tentar burlar a lei, os proprietários de cortiços se organizaram numa agremiação corporativa de proprietários de prédios.

Os proprietários de cortiços e estalagens apelaram ao Estado contra as leis sanitárias que colocavam como impróprias as moradias consideradas danosas à saúde pública e protestavam sob a alegação do desrespeito do governo ao direito à propriedade. Fechamentos repentinos de algumas estalagens poderiam também trazer à tona a irritação dos inquilinos, que ora, despejados, não teriam outros meios de providenciar acomodações baratas num curto prazo.


As zonas urbanas: reformas e origem das favelas.


O crescimento da economia, propiciada pelas atividades portuárias e a ascensão do capital nacional e sua adesão ao capital internacional fez com que o meio urbano exigisse uma reorganização. Em 1902, o prefeito, Antônio Pereira Passos, nomeado pelo presidente da República, Rodrigues Alves, baixou leis extremas para tentar remodelar a cidade do Rio de Janeiro. Entre outras realizações, o prefeito Passos, dividiu a cidade em zonas, imputando a mentalidade “civilizatória”, assim como nas grandes cidades européias, onde a elite era a classe considerada civilizada. As zonas insalubres foram deixadas para a massa pobre. A prefeitura do Rio de Janeiro proibiu as obras de melhorias nos cortiços. Criava-se assim uma enorme quantidade de pessoas pobres desabrigadas. Com a escassez de moradias, os aluguéis no centro do Rio de Janeiro subiram assustadoramente, tornando-se inacessíveis às camadas populares. (Ribeiro & Pechman, 1983) A origem das favelas tem suas raízes nas deficientes políticas habitacionais de cidades em processo de industrialização, segundo afirma Ribeiro & Pechman. Nesse ínterim, apenas na década de 1940 é que o Estado entrará em cena com uma política voltada para o saneamento do déficit habitacional. Mas, a intervenção do Estado, estará voltada para os interesses do capital e da classe dominante.


Referências bibliográficas

RIBEIRO, Luis César de Queiroz, PECHMAN, Robert Moses: O que é questão de moradia. São Paulo: Editora Brasiliense. 1983